Na manhã desta sexta-feira, 27 de junho, o Engenheiro Ambiental Farley de Oliveira Xavier deu início ao segundo dia do I Encontro Rondoniense de Engenharia Ambiental e Sanitária, realizado na Estácio Unijipa, em Ji-Paraná/RO, com uma palestra de grande relevância técnica e social. Com o tema “Abordagem analítica da emergência hídrica ocorrida nos municípios de Espigão do Oeste, Santa Luzia D’Oeste e Cerejeiras/RO em 2024” Farley Xavier, apresentou um panorama profundo sobre a crise hídrica que assolou o estado em 2024.
A imagem inicial da palestra — uma borboleta voando suavemente ao som de uma motosserra ao fundo — serviu como símbolo da delicada relação entre natureza e ação humana. “A metáfora do bater de asas da borboleta nos lembra que pequenas ações podem gerar grandes transformações. Mas o contrário também é verdadeiro: pequenas ações podem evitar grandes desastres”, afirmou Farley, ao conectar a teoria do caos à realidade ambiental de Rondônia.
O caso emblemático de Espigão do Oeste, em outubro de 2023, foi relembrado: o rio secou, deixando mais de 20 mil habitantes e uma planta frigorífica com 1.100 trabalhadores sem acesso à água. Em resposta à crise, foi elaborado um dos pareceres técnicos mais complexos já produzidos pelo Ministério Público do estado. O documento, com apenas 12 páginas, foi redigido em 24 horas sob intensa pressão.
No dia 14 de agosto de 2024, a medição da vazão do Rio Palmeira indicou 135 litros por segundo. Após correções técnicas, a vazão real foi estimada em 10,37 milhões de litros por dia. O consumo total, somando a CAERD e o frigorífico AV Norte, era de 6,65 milhões de litros por dia. “Cada dia de inação significava a perda de 6 milhões de litros de água. Era como jogar fora o que poderia salvar vidas nos dias seguintes”, alertou Farley.
No dia seguinte, ele conheceu o senhor Wallace, gerente local da CAERD, que junto com sua esposa, identificou uma represa de 10 hectares e instalou 600 metros de tubulação improvisada. “Eles não esperaram ordens. Eles agiram. E isso salvou a cidade”, destacou. A régua de medição foi pintada à mão pela esposa de Wallace. “Não foi o prefeito, não foi o engenheiro da companhia. Foi o Wallace e a esposa dele. Isso é compromisso com a comunidade.”
Com base nas medições, Farley estimou que o reservatório do Seu Chico armazenava cerca de 100 milhões de litros — suficiente para 25 dias. Mas não havia uma reserva de emergência. “O colapso parcial começa quando se usa a reserva de contingência. O colapso total é quando ela acaba. E aí, só restam os caminhões-pipa e a calamidade pública.”
No dia 19 de agosto, Farley tomou uma decisão difícil: convocar uma reunião de emergência. “Eu sabia que era um risco. Mas não podia me calar. Liguei para a Dra. Valéria e pedi que reuníssemos o prefeito, os promotores, o Corpo de Bombeiros. Era agora ou nunca.” A reunião aconteceu às 15h. “Apresentei os cálculos. Disse: o Rio Palmeira pode secar a qualquer momento. E o que foi feito até agora?”
A resposta foi o silêncio. Nem o município, nem o frigorífico tinham planos emergenciais. “O engenheiro ambiental é o médico do meio ambiente. E naquele momento, o paciente estava em estado crítico.”
O parecer técnico recomendou não aprovar o plano da CAERD de barramento em área de preservação permanente. Em vez disso, sugeriu o uso de áreas de várzea, menos impactantes. “Mesmo em uma emergência, é preciso ser responsável. Não se pode atropelar a legislação ambiental.”
A mobilização rápida, a reunião de emergência e a preparação do reservatório foram fundamentais. “Eles ajustaram a tubulação, deixaram tudo pronto. Ganharam tempo. E tempo, naquela situação, era tudo.”
Farley encerrou sua fala com uma reflexão que ecoou entre os presentes: “Ainda não vimos, em nenhum dos municípios visitados, um sistema de alerta precoce eficaz. Mas uma ação pequena, um choque de realidade, pode despertar as pessoas e evitar uma catástrofe. O bater de asas de uma borboleta pode provocar um furacão. Mas também pode evitá-lo.”
Foto: Isadora Fernandes